estava olhando pela janela a rua lá fora e pensando no meu gosto por autores marginais. naqueles outsiders, deslocados, que pouco se fala numa aula de história da filosofia. naqueles que quando falamos a voz sai com dificuldade. que quando tentamos escrever sobre, as letrinhas caem como bolinhas de vidro e se quebram no chão. naqueles consumidos pela aporia mesmo. nos que não se encaixam no cânone, porque a vida não permite. não há tempo e um sistema filosófico é nada.
lembro da melancolia de benjamin. nas frases quase no limite do sentido de derrida. de kierkegaard, cuja filosofia se confunde irremediavelmente com sua biografia de revolta e desespero. heidegger disse uma vez para sua mulher, falando sobre si mesmo: a vocação para uma tarefa é também uma condenação à solidão. todos queimaram a vida. todos consumidos pela aflição e pela angústia.
defendi em minha tese de que há laços de família entre esses filósofos que escreveram à margem da história da filosofia. e deve haver, pois de certa forma se parecem. há laços entre aqueles que observam de longe o jogo da filosofia oficial. que espreitam pelas frestas das janelas tentando entender o mundo lá fora. os que olham as pessoas passando, os carros parados nos sinais fechados e enxergam muito mais.
o tecido da história, assim nos ensinam, foi composto fio por fio de forma ordenada. mas as filosofias propostas por esses autores são feitas de pedaços informes, tão movediças quanto a areia das dunas. foi preciso quebrar o ser. fragmentá-lo. e mesmo assim não sobrou nada. nem um pedaço sequer. o que se buscava era tão profundo que ninguém, nem mesmo eles, ousarem chegar perto. a única coisa que pode aproximar desse mistério, e talvez consolar ou suavizar, é um jeito (novo) de escrever. só assim se tem alguma fé ou confiança. porque torna um pouco claro e luminoso o que era ambíguo e obscuro.
há sim laços entre aqueles que tentam vislumbrar o fundo dos abismos. como se todos viessem da mesma noite em que o silêncio preenche todos os espaços, deixando submersas em tristezas a aporias todas as coisas em sua volta.
há laços.
e apesar disso, são sempre tão sozinhos.
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