O histórico da Agência Espacial Brasileira nunca foi dos melhores. Na verdade, desde o terrível incidente envolvendo um ônibus escolar e algumas toneladas de combustível para foguetes, todos deram por acabadas as pretensões brasileiras de viajar pelo espaço. Por isso não foi com pouca surpresa que o povo brasileiro reagiu ao anuncio de sua presidente do lançamento de uma espaçonave tripulada.
A missão não era nem um pouco modesta: explorar novos mundos, e, apesar de ninguém ter confirmado publicamente, encontrar vida inteligente em outro planeta. Para isso, o governo enviou seus melhores homens: capitão José Santiago e alvejante (uma patente até então desconhecida nas forças militares) Teodoro Peixoto. E como a imagem que o o brasileiro médio tinha da AEB não era das melhores, era necessário recorrer a alguém que estivesse acima de qualquer suspeita. Alguém que o povo brasileiro soubesse que podia confiar em qualquer situação. Depois de longas reuniões e discussões, não havia dúvida entre os membros mais poderosos do governo que essa pessoa tão amada e querida só poderia ser uma: o apresentador Fausto Silva. Por sua popularidade, Faustão foi chamado para comandar a missão, que ele acabou nomeando de Missão Quem Sabe Faz Ao Vivo.
Para completar o time de tripulantes, foi enviado para o espaço também um filhotinho de gorila chamado Sandoval. A explicação para o envio do pequeno Sandoval era muito simples: alguém poderoso do governo brasileiro achou que seria uma boa ideia. E de fato acabou sendo. Do ponto de vista da publicidade, foi brilhante. Sandoval era quase tão amado pelo povo brasileiro quanto Fausto Silva. A imprensa, em especial, adorou o pequeno gorila, que acabou sendo apelidado de Soldado Sanduva.
Mesmo os engenheiros mais sérios, que alertavam sobre os perigos de se ter um filhote de gorila numa nave espacial, acabaram se rendendo aos encantos do Soldado Sanduva quando viram o quanto ele ficava bonitinho e fofo na sua roupinha de astronauta. Era como se ele fosse um pequeno homenzinho. "essa fera aí, grande Sandoval, tanto no pessoal quanto no profissional" - dizia o chefe da missão.
Todos amavam o gorila Sandoval e o chefe Faustão. Na verdade, quase todos. Alvejante Teodoro Peixoto sentia ciúmes. Peixoto era jovem, bonito e ficava ótimo de uniforme. Pelo menos era o que as garotas bêbadas do bar diziam. Desde criança ele sonhava em ser astronauta. Viajar pelo espaço, estar onde nenhum outro homem esteve, sentir-se insignificante perante o infinito do universo, essas coisas. Peixoto era vaidoso e egoísta. Queria ser conhecido, queria estar nas capas de revistas e dar entrevistas. Não aceitava que Fausto Silva, um apresentador de televisão sem nenhuma experiência militar e visivelmente fora de forma, tenha sido escolhido para liderar a missão. Peixoto queria toda a atenção da mídia para ele, queria ter fãs histéricas gritando o seu nome como um rockstar, queria que as crianças sonhassem em ser astronauta por causa dele. Mas agora, em razão do gorila Sandoval e do apresentador Faustão, a maioria das pessoas nem sequer sabia o seu nome. Para onde quer que o alvejante Peixoto olhasse, ele só via o rosto fofo daquele maldito filhote de gorila e daquele apresentador gordo falando "ô loco, meu, mais do que nunca, exatamente às sete e oito da noite..."
Se alguém tivesse reparado nesse estado de coisas, talvez o alvejante Peixote tivesse sido submetido a um teste psicológico antes do lançamento. Talvez, então, tudo poderia ter sido evitado. Mas o fato é que ninguém havia reparado no alvejante Peixoto, que alimentava sua raiva em segredo.
O lançamento foi marcado e aconteceu sem maiores imprevistos. Foi feita uma contagem de 1 a 13 e só depois alguém se deu conta que a contagem deveria ter sido regressiva. De qualquer forma, o lançamento foi um sucesso. Apenas alguns convidados do consulado americanos que foram postos para assistir o lançamento perto do foguete morreram carbonizados, mas ninguém ligou muito para isso porque o Faustão estava no espaço com um filhote de gorila chamado Sandoval e isso era muito empolgante.
Algumas horas depois, na base aeroespacial do governo brasileiro, chamada de Base Sarney, um homem com um belo bigode escuro tentava a primeira comunicação com o foguete do Faustão. Ele apertava os botões, verificava se os cabos estavam conectados, testava o sistema de som e apertava novamente os botões, para depois checar novamente os cabos. O moço de belo bigode repetiu essa operação três vezes e então falou irritado:
- Não é possível, tudo deveria estar funcionando perfeitamente.
Sem ter o que fazer, o cara do bigode voltou para a mesa de computador e resolveu verificar novamente se os cabos estavam conectados. Enquanto ele estava curvado embaixo da mesa mexendo nos cabos e nos fios, um importante político entrou na sala e veio tirar satisfações. Não era qualquer político, mas sim o presidente do senado, Renan Calheiros. O senador estava muito irritado:
- Já conseguiu se comunicar com eles?
- Ainda não, senador. Eu já fiz de tudo, mas não consigo estabelecer uma conexão - disse o bigodudo.
- Deixe que eu resolvo isso.
O dono do bonito bigode se afastou e deixou o senador Calheiros tomar lugar na frente da mesa. Ele apertou alguns botões e esperou a chamada.
A linha estava ocupada.
Ele então discou novamente o número do foguete do Faustão.
- Dois quatro meia sete dois oito meia sete... - repetia o senador enquanto discava.
- O número discado não recebe chamadas ou não existe - disse uma gravação.
- E agora? - disse preocupado o moço de bigode.
- Teremos que chamar a presidenta - respondeu o senador, assustado.
Pouco tempo depois a presidente Dilma entrou na sala e já foi logo perguntando para os dois:
- Qual é o problema afinal?
- Não estamos conseguindo comunicação com o foguete, a ligação simplesmente não acontece - disse Renan Calheiros.
- Mas vocês estão colocando o DDD do espaço? - falou a presidente.
- Como? - se surpreendeu o senador.
- O DDD do espaço, porra! Será que eu tenho que fazer tudo por aqui? - disse irritada a presidente do Brasil - na verdade é DDI porque é ligação para fora do Brasil, mas deve ter algum código de área também porque o espaço é muito grande, maior que o Maracanã, dizem.
- Eu estava tentando discar apenas o número - falou o cara do bigode.
- Cacete! - esbravejou a presidente - aí você não vai ligar para porra nenhuma, né. Você precisa discar o zero zero mais o código da operadora mais o DDI do espaço mais o DDD do nosso sistema solar e só aí você disca a bosta desse número, tá bom? Não ensinam nada disso na faculdade de foguetes?
- Mas como eu vou saber como é o DDI do espaço? E o DDD do nosso sistema solar? Não tem uma lista telefônica por aqui?
- Olha, meu amigo, você é o responsável pelas comunicações por aqui, então no que se refere a comunicações, você e só você deveria dar conta. O mínimo que você deveria saber fazer era uma simples ligação para um foguete. Minha paciência está acabando e eu tenho mais duas obras para inaugurar ainda hoje. Então dá um jeito de ligar logo para essa droga de foguete porque eu quero falar com o Faustão e ver se está tudo bem com o gorila, certo?
A presidente Dilma nem esperou resposta, apenas se virou e foi embora. Ela é durona assim. É o preço que se paga por se querer ser a mãe do Brasil.